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O mediador frente a um ser humano integral

Camila Valente*


- Conheces David Bohm?


- Não. No que é bom?


- Trocadilho espirituoso, meu caro! Que bom que ainda é; que pena que já se foi. Mas, no tempo em que esteve aqui, sua genialidade trouxe aportes sobre filosofia, visão científica e sobre diálogo. Trouxe clareza e entendimento sobre o processo em que duas ou mais pessoas se achegam para trocar perguntas, botar para fora o que vem do coração ou ainda fazer pedidos sobre suas necessidades. Falou também sobre pressupostos e sobre evidências. Relacionou-os com o que vem a ser uma opinião.


- Trabalho áspero esse de seu estimado parceiro!


- Eu o nomeei obreiro, que, pela fala, constrói pensamentos. Muito mais até do que isso, tornou-se luz infinita ao visionar e desvendar mais um pouco daquilo que, sem o devido cuidado, é capaz de torna-se escuridão.


...


Qual resposta você daria a alguém que lhe pedisse uma conceituação da palavra pressuposto? Certamente, estimado leitor, tenho que acatar o fato de não se tratar de uma pergunta costumeira - daquelas utilizadas em conversas habituais entre afins, das do tipo: “como você está?”, “o que tem feito por aí?”. Mas, visando a uma boa prosa, percepções e insights variados sobre a natureza dos diálogos, aí, sim, há que se dar a devida astúcia a essa indagação: o que constitui um pressuposto?


Nas palavras do autor David Bohm, “um pressuposto é a melhor suposição que se pode fazer com base em evidências.” E o autor vai além, ao dizer que “na maior parte dos casos estes pressupostos poderiam ser chamados de opiniões” e que essas são tão fortes que fazem com que as pessoas se identifiquem realmente com elas.


Por meio dessa compreensão, podemos inferir que, todos nós, seres humanos, desenvolvemos nossas melhores suposições de diferentes maneiras e muitas delas são baseadas em circunstâncias e experiências amealhadas no decorrer da vida, manifestadas por meio de um punhado de crenças advindas de saberes familiares, ambientais e/ou sociais. Hum. Ilustremos por aqui: poderia um indivíduo supor não dever atravessar uma ponte de madeira ligada a duas extremidades entre um rio caudaloso, haja vista testemunhos obtidos de que tais madeiras se encontram em seu pior estado de conservação e com suas peças inadvertidamente pregadas? Possivelmente, seria essa uma razoável ponderação ao sim. Pela pergunta lançada, eis aí um simples exemplo de melhor suposição a partir de uma evidência, que constrói um pressuposto, dito aqui como opinião: “essa ponte não é segura”.


Frente a um bocado de evidências, costumamos validar nossas opiniões e construímos narrativas particulares sobre diferentes aspectos do cotidiano da vida, confirmando nossas hipóteses - diante de tudo e um pouco mais que habita nosso mundo.


Ainda mais profundamente, ao estabelecermos um processo de comunicação com pessoas é possível encontrar outro atributo importante e muito valioso em um diálogo: a necessidade. Necessidade, palavra etimologicamente derivada do latim necessarius, significa “o que é indispensável”, “o que não tem volta”. Necessidade então, constitui a pulsão genuína que produz um senso de urgência e importância a tudo aquilo que é possível querer-se priorizar. Diante dessa ótica do indispensável, torna-se possível compreender a complexidade das narrativas e quanto podem elas estar arraigadas a nossas suposições.


Ao transpor esses conceitos (e o olhar) para as dinâmicas ocorridas no ambiente de uma mediação, mediadores veem-se rodeados por comportamentos, pressupostos e pensamentos, corriqueiros ou singulares, que, quando apreciados de forma genuína, podem ser capazes de contribuir fortemente para pavimentar o caminho do consenso. Ao nos dispormos a manejar processos de diálogo é importante vislumbrar tais indivíduos como seres humanos distintos, com suas diferentes crenças e processos mentais que definem e englobam suas opiniões, preferências e pressuposições. É uma grande habilidade facilitar processos que garantam a devida e justa autonomia para que todos exponham e manejem seus conflitos. É de grande riqueza acolher, ter empatia e apoiar esse processo.


Seja pelo desafio conceitual até aqui exposto, seja pela experiência vivencial da facilitação, o que nos é verdadeiramente garantido é a oportunidade de ampliar a consciência sobre a vasta dimensão dos indivíduos sob a ótica integral. De acordo com o autor Ken Willber, todas as verdades são parciais, vale dizer, todos os indivíduos estão parcialmente certos, logo, a grande oportunidade que temos ao facilitar diálogos é percebermos a riqueza que existe na integração e complementaridade.


Que, a partir da expansão da consciência de nosso papel, cuidemos para não recortar pensamentos, enquadrá-los de acordo com nossas arraigadas convicções. “Conhece-te a ti mesmo” - antes - para conhecer verdadeiramente aos homens. Dome seus gatilhos, torne-se vulnerável e empático com assiduidade e torne seu servir fonte de pacificação.



*Consultora Organizacional e Coach Executiva. Pesquisadora das relações humanas com 9 anos de experiência desenvolvidos em facilitação de diálogos no âmbito público e privado. Especialista em Gestão de Pessoas pela Universidade de São Paulo – USP. Formação em Coach Executivo com bases antroposóficas pela Escola de Coaches EcoSocial. Action Learning Coach pela Wial Global, com atuação como coach de equipes no programa Wial Gives Back, nas Cruzes Vermelhas da Bolívia, Colômbia e Equador. Consultora Organizacional Sistêmica pela Faybel Consultoria. Mediadora de Conflitos pelo Instituto Mediare (módulo teórico), com forte atuação em resoluções de conflitos com ênfase no modelo linear e CNV. Bacharel em Direito.



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