Transcendendo a Mediação: Pedagogia (ou filosofia?)
Após o alegre convite ao compartilhamento com os amigos e amigas que medeiam por aí, me ocorreu compartilhar algo que me instiga: a relação intrínseca entre a mediação e a pedagogia, e como esta relação pode ser potencializada, aproveitando a onda proporcionada pelo MEC com a implementação do aprendizado da mediação nas faculdades.
O convite aqui é para mergulharmos no que vivemos na mediação e percebermos o impacto pedagógico desse mindset. E, nessa percepção, transcendermos a mediação como método adequado de resolução de conflitos e chegarmos no mindset da mediação como pedagogia, transitando por uma eventual filosofia do humano, profundo? Vamos descobrir.
Mergulhando na vivência da mediação:
Ao mergulharmos na mediação, rapidamente percebemos que, quando nos capacitamos como mediadores e mediadoras e quando mediamos, internalizamos e aprimoramos competências e habilidades diferentes das que usualmente aprendemos em faculdades, ou pelo menos na maioria das que conhecemos. Quando nos capacitamos como mediadores, desenvolvemos competências comportamentais, aprimoramos habilidades humanas, e talvez isso que faça o estudo e a prática da mediação tão prazerosos. Não que seja fácil, pois aprimorar essas habilidades "simples" como comunicação, empatia e autogestão (das próprias emoções e julgamentos) requer muitas vezes reaprendê-las e ressignificá-las, em um constante autoconhecimento. Desta forma, a mediação possibilita o desenvolvimento de um mindset autorresponsável, plenamente atento, não-violento, humilde e imparcial. Assim, o mergulho na mediação permite um aprimoramento não apenas para as mediações que conduzimos, mas, e principalmente, para a vida.
O impacto pedagógico desse mindset:
Com isso, o timing de implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de graduação em Direito possibilita aproveitar a inclusão de cadeiras de mediação nas faculdades como oportunidade para auxiliar os graduandos a transcenderem a teoria aprendida e chegarem no aprendizado de si mesmos enquanto possíveis agentes de transformação. Assim, além de aprenderem sobre a mediação como método de autocomposição de conflitos, o fato de poderem perceber que existe um mindset diferente do que estamos acostumados, um mindset que considera a si mesmo e ao outro na sua integralidade, que percebe as interconexões e se responsabiliza por seus atos, que vê no conflito, não o fim, mas uma oportunidade de fazer diferente, é o grande potencial positivo quando pensamos no impacto pedagógico do mindset desenvolvido através da mediação.
E aqui vale ressaltar esta parte do Parecer que homologou as Diretrizes, que trata do perfil do egresso do curso de Direito e transmite uma mensagem instigante que possibilita uma visão otimista: "O curso de graduação em Direito deverá assegurar, no perfil do graduando, sólida formação geral, humanística, capacidade de análise, domínio de conceitos e da terminologia jurídica, adequada argumentação, interpretação e valorização dos fenômenos jurídicos e sociais, além do domínio das formas consensuais de composição de conflitos, aliado a uma postura reflexiva e de visão crítica, que fomente a capacidade e a aptidão para a aprendizagem, autônoma e dinâmica, indispensável ao exercício do Direito, à prestação da justiça e ao desenvolvimento da cidadania. Desta forma, deverão ser consideradas estratégias de ensino que valorizem o protagonismo discente de forma a possibilitar uma formação profissional que revele competências cognitivas, instrumentais e interpessoais de relevo ao profissional de Direito." [grifos nossos]
Transitando por eventual filosofia do humano:
Aqui, podemos ir além e considerar que todos nós humanos, enquanto seres sociais, mediamos a todo o momento. E, neste sentido, em tempos de conectividade, paradigma da abundância e novas economias (criativa, compartilhada, colaborativa, multi-valores, distribuída), o aprendizado da mediação possibilita a ampliação da percepção, para que seja possível considerar que podemos realmente mediar a todo o momento, sempre respeitando a autonomia da vontade dos envolvidos, e ainda assim tendo a oportunidade de convidá-los ao diálogo e à ressignificação das divergências como oportunidades.
Neste sentido, uma pedagogia com mindset da mediação pode auxiliar o aluno a ser o protagonista da própria vida e desenvolver o empreendedorismo de si mesmo, a partir da autorresponsabilização pelas suas escolhas e consequente busca de autoconhecimento para refletir seu potencial em mais para o seu meio circulante. E aqui entra a mediação em outro nível, naquele que não se vê, e que, ainda assim, possibilita acontecer. A todo momento, mediamos também no sentido de sermos meio, canais para que algo aconteça. E na mediação como método autocompositivo não é diferente, pois o mediador será meio para que algo aconteça entre as partes. Podendo chegar a ser peça fundamental, sem ser protagonista.
Se relacionar-se é uma arte, o mediador é quem auxilia e muitas vezes até mesmo possibilita que a arte aconteça. E assim seguem em frente os mediadores e mediadoras, como artistas de bastidores, potencializando a arte dos protagonistas e o aprimoramento social.
E se aprender também é uma arte, o professor é quem medeia o espetáculo do conhecimento, mantendo o aluno como protagonista do próprio aprendizado e evolução. E se assim seguissem os professores, igualmente como artistas de bastidores, potencializando a arte dos protagonistas alunos e o aprimoramento social a partir dos impactos positivos que estes últimos podem causar com os conhecimentos desenvolvidos?
As consequências podem ser exponenciais e, felizmente, as cadeiras de mediação estão aí como oportunidades pedagógicas únicas.
*Camile Souza Costa é uma entusiasta da vida e conduzida por ela, movida por projetos instigantes e pelo compartilhamento. Consultora em propriedade intelectual, mentora em programas de empreendedorismo, mediadora com LLM em International Commercial Law and Dispute Resolution pela Swiss International Law School, idealizadora do Meeting de Negociação e fundadora da Sermais.me. Encontrou na Negociação, na Mediação e na Mentoria os canais para desenvolver as trocas e potencializar realidades mais conectadas com a essência de cada um: mesmo quando o conflito, externo ou interno, é o primeiro sinal percebido, acredita ser possível ser mais e fazer mais, para si e naturalmente com os demais.