Dois Irmãos à frente da Empresa da Família: parceria ou confusão? - parte final: Enfim, a Mediação!
Os mediadores chegaram à empresa dos irmãos Liz e Thomas acompanhados de Laura - amiga de infância que indicara a Mediação como um espaço de facilitação do diálogo, de estímulo à compreensão das diferentes perspectivas e percepções do contexto fático e de coconstrução de entendimentos, sempre com o viés prospectivo. Percebia-se um cochico entre os funcionários... Compreensível: estavam todos apreensivos com o porvir. A expectativa de se a mediação seria o caminho adequado à superação da controvérsia era simplesmente imensa. Aqueles mais antigos, que integravam a empresa desde a época de Liz, estavam entre os otimistas: acreditavam que uma conversa facilitada por profissionais com expertise em negociação colaborativa resolveria o imbróglio. Os mais novos, que não haviam convivido com a irmã mais velha de Thomas, tinham a impressão de que a mediação talvez pudesse ser uma grande perda de tempo e energia. Catarina e Rodolfo haviam mediado conflito acirrado entre Laura e sua sócia. Diferentemente do que se imaginava, a Mediação não se centrou em argumentações e contra-argumentações ou em propostas e contra-propostas. Laura e Sofia haviam idealizado soluções para a controvérsia. No entanto, os mediadores as estimularam a compartilhar suas vivências dos anos de interação, do projeto empreendedor e da realidade da atividade empresária. A experiência foi surpreendentemente positiva e o resultado superou em muito as expectativas de ambas - muito embora não tenha coincidido com as idealizações originais. Laura estava convicta de que a Mediação proporcionaria a ambiência apropriada às conversas difíceis que Liz e Thomas precisariam ter. Alguns dias antes, havia estado com cada um dos amigos individualmente. Sabia que existiam suposições equivocadas, interpretações exageradas, incompreensões recíprocas, frustrações de parte a parte. Os irmãos haviam significado as falas e as atitudes um do outro a partir de premissas que nem sempre correspondiam. Laura aprendera com a experiência da Mediação que “entre o que eu penso, o que quero dizer, o que digo e o que você ouve, o que você quer ouvir e o que você acha que entendeu, (por vezes) há um abismo” (Alejandro Jodorowsky). Essa compreensão já seria um bom começo de conversa entre os irmãos e sócios. A confiança de uma amiga tão querida no procedimento e nos profissionais fez toda diferença para Liz e Thomas. Nenhum dos dois tinha qualquer expectativa de que realmente funcionasse... No entanto, o entusiasmo e a convicção de Laura eram tão contagiantes que resolveram acolher a sugestão e participar da reunião de pré mediação.
Depois das apresentações, Laura se despediu, colocando-se à disposição para ajudar no que mais pudesse ser útil. Os mediadores combinaram com Liz e Thomas que estariam juntos por cerca de uma hora e que esse primeiro encontro teria por objetivo o compartilhamento de informações. Os mediandos contextualizariam, a partir de suas diferentes significações dos acontecimentos, a controvérsia; os mediadores exporiam se e como a Mediação poderia contribuir para a redefinição da tônica conflitiva em um cenário desafiador sim, mas passível de a ser equalizado pelo viés da co-laboração. Enquanto se conotasse a situação como conflitiva seria difícil afastar a lógica da desqualificação recíproca dos argumentos, das atitudes e até mesmo das pessoas. Na medida em que se compreendesse que os sócios eram interdependentes e que apenas por meio do trabalho conjunto seria possível identificar opções que atendessem aos dois em seus interesses e necessidades, o conflito se transformaria em dilema e aí seria uma questão de tempo até que se alcançasse uma solução legitimada por todos. Pelo tom inaugural de Liz e Thomas, percebia-se a sensação recíproca de incompreensão. Os irmãos não compreendiam, tampouco se sentiam compreendidos. O desgaste, a frustração, a angústia permearam as narrativas em diversos momentos. Como comumente acontece na mediação, a escuta empática pelos mediadores dos sentimentos e pensamentos de cada um dos mediandos ambientou todas as demais intervenções, trazendo clareza de propósitos a Liz e Thomas. Não foram momentos fáceis para nenhum dos dois. Muito havia sido dito. Seria difícil simplesmente deixar passar. Contudo, a clareza quanto às motivações e a identificação do que era verdadeiramente importante para cada um determinou o sucesso das tratativas. Thomas queria a irmã por perto. Sabia o quanto ela podia agregar de valor à empresa e como era parceira, inclusive nos momentos mais difíceis. Ele precisava no entanto que sua liderança fosse legitimada por ela. Havia trabalhado duro para conquistar a confiança do pai e conseguir implementar projetos ousados mas muito promissores que mudaram definitivamente os rumos da empresa e já sinalizavam no sentido de que bons frutos seriam colhidos em um futuro relativamente próximo. Liz admirava e queria preservar as conquistas do irmão. Sabia de seu esforço e de como sua dedicação havia sido valorosa para a empresa. Era contudo importante que ela tivesse sua reinserção respeitada. Não poderia deixar de honrar o compromisso assumido com o pai, de que estaria ao lado do irmão quando ele lhes faltasse. No mais, não era do seu perfil deixar de contribuir para o sucesso de um empreendimento do qual fazia parte. Combinaram que Liz retomaria a diretoria de Marketing, o que lhe oportunizaria um equilíbrio ótimo em termos de dedicação à família e à empresa, e que Thomas seguiria na liderança da firma, o que garantiria estabilidade nas articulações com os funcionários, parceiros profissionais e clientes. Todas as definições estratégicas seriam objeto de deliberação conjunta. Manteriam-se interlocutores nos momentos mais desafiadores. Liz e Thomas, como é clássico entre irmãos que sempre foram muito próximos, se despediram dos mediadores com o sentimento compartilhado de que aquelas semanas de desgaste foram fruto de um desentendimento fraternal passageiro, que não mereceria qualquer destaque especial em suas histórias.