Afinal, o que é essa tal de mediação?
Dia desses andava pelo bairro, num domingo à tardinha, quando esbarrei com um amigo de colégio. Ele veio animado saber: "afinal, o que é essa tal de mediação?". Acabamos em um café conversando por horas a fio.
Ele me contou que vinha desenvolvendo uma atividade empresária com um amigo nosso de infância. Desde muito novos, sempre foram parceiros: no futebol, nas atividades de classe da escola, nas aventuras de adolescência... Na faculdade de Engenharia, foram colegas de turma. Nos dois anos de estágio, fizeram parte de uma mesma equipe em um projeto que os inspirou e desafiou a pensar grande. A constituição de uma sociedade empresária entre eles acabou sendo um caminho natural.
No entanto, muito embora os primeiros anos tivessem sido de parceria e muito sucesso, o decurso do tempo e a ampliação dos negócios acabaram desgastando o relacionamento, fazendo-o sentir os efeitos colaterais de uma série de incompreensões recíprocas.
Lucas - vamos chamá-lo assim - esperava de Bernardo - nome também fictício - um envolvimento com o cotidiano da empresa, diferente daquele que o sócio parecia poder oferecer. A questão que se colocava era: como eles poderiam seguir caminhos separados sem perdas significativas em termos financeiros e de imagem?
Ouvi meu amigo com escuta ativa e empatia próprias de mediadora. Conquanto eu me sentisse tão amiga de um quanto do outro e, por essa razão, bastante imparcial - ou, como diria Dominic Barter, pluriparcial -, pretendia ajudá-los na decisão de se a mediação seria o método mais adequado e na escolha de mediadores com perfis consonantes com o contexto vivenciado.
Comecei dizendo a Lucas que a mediação tinha como um de seus objetivos principais a investigação dos interesses, das necessidades, dos valores e das preocupações de cada um dos envolvidos na controvérsia. Não seria uma dinâmica voltada ao convencimento de quem quer que fosse. De nada serviria que ele sentasse à mesa de negociação com uma proposta "na manga", esperando que Bernardo pudesse lhe fazer uma contraproposta. O convite seria de exploração de opções plurais a partir de um mapeamento preliminar das diferentes perspectivas, compreensões, motivações, interpretações e expectativas.
Em mediação, todos os aspectos do conflito - sociais, emocionais, culturais, financeiros, jurídicos etc. - seriam levados em consideração. Tudo aquilo que fosse significado como importante por qualquer dos mediandos também o seria pela mediação e seus mediadores. A busca seria pela identificação do senso de justiça, coerência, razoabilidade e proporcionalidade inerente àquela relação, de forma que as premissas que ensejariam o silogismo pudessem ser validadas por todos.
Os mediadores funcionariam como tradutores simultâneos. Ao longo das narrativas, ouviriam as pretensões - soluções antagônicas e/ou incompatíveis idealizadas pelos mediandos - e lhes devolveriam resumos, ressaltando elementos oriundos das falas dos próprios mediandos, a serem considerados quando da fase negociação.
Mais adiante, depois de compreenderem o ponto de vista de Lucas e Bernardo, trariam perguntas que pudessem fazê-los perceber a situação pela perspectiva do outro. Isso porque seria a empatia recíproca que ensejaria um "brainstorm" voltado a soluções ganha ganha e, portanto, sustentáveis no tempo.
Lucas ficou muito interessado na descrição do procedimento e me confidenciou que, se Bernardo e ele tivessem conhecido a mediação anos antes, possivelmente teriam conseguido celebrar bons "acordos de sócios", o que certamente teria representado uma mudança de rumos para a relação societária.
Deixei meu amigo naquela tarde com a pergunta: será que uma boa conversa, facilitada por mediadores experientes e comprometidos com o sigilo, não poderia potenciar as chances de uma co-construção do destino (quem sabe ainda promissor) da sociedade?